Mestre Paulo Siqueira nasceu no Rio de Janeiro em 1955. Migrou para a Alemanha na década de 1980, onde ficou conhecido por organizar, desde 1987, o "Capoeira Sommer Meeting", um dos grandes eventos de capoeira da Europa nas últimas décadas do século XX.
Matthias Röhrig Assunção (novembro de 2024)
Inicialmente morava com sua mãe em Bonsucesso e frequentava a casa de sua avó paterna no vizinho bairro de Ramos. Depois passou a residir com sua avô materna, numa vila em Botafogo. Ou seja, passou sua infância circulando entre a Zona Sul, Flamengo e Botafogo, e a Zona Norte, Ramos, Olaria e Penha. Paulo lembra que a primeira vez que viu “uns caras se aquecendo fazendo movimentos de capoeira” foi na concentração da Portela, na Candelária, de onde as escolas de samba saíam para o desfile na Presidente Vargas.
Quem o levou para a para a academia de capoeira de Mestre Roque foi seu amigo Rubens, um bombeiro que praticava boxe e capoeira e morava no Cantagalo: “E quando eu cheguei lá no Morro do Pavão pela mão do Rubens, o Mestre Roque tava dando aula, mas já tava querendo sair por motivos pessoais, querendo parar lá e entregar pro aluno mais adiantado dele, que era o Adilson. O apelido do Adilson era Adilson Camisa Preta”. Paulo começou a treinar com Adilson, sob orientação de M. Roque a partir de 1972, mais ou menos.
Na imagem: Mestre Paulo Siqueira, por volta de 1978, toca berimbau na academia dos Mestres Roque e Adilson. Foto do acervo Paulo Siqueira.
Tinha uma menina que se chamava Sandrinha. Essa era a melhor menina que jogava capoeira, a meu ver, naquela época, era a melhor capoeirista que tinha, mulher! E lá no morro só tinha duas na aula da gente. Só tinha duas, era a Sandrinha e uma outra que ia de vez em quando. Mas a Sandrinha tava lá direto, treinava direto e treinava com os homens.”Passados alguns anos, quando já era um aluno mais avançado, Adilson convidou-o: “Você não vai mais pagar capoeira não. Agora você vai trabalhar comigo”. E passou a levá-lo para fazer apresentações com ele e outros alunos em casas de espetáculos, como o show Bahia Saravá, de Almir Sinclair, na Galeria Alasca e no Hotel Intercontinental, no Vidigal. Anos depois, Paulo Siqueira foi graduado mestre.
No mundo do espetáculo
Também através de Adilson, Siqueira conheceu Mercedes Batista, a primeira dançarina negra a entrar para o Theatro Municipal e que depois se tornaria coreógrafa famosa. Ela concedia bolsas para capoeiristas estudarem em sua academia, em Copacabana. Mercedes afirmava que “Capoeirista não pode ser só capoeirista! Se vocês querem trabalhar no teatro têm que aprender a fazer outras coisas.” E, ainda segundo as lembranças de Paulo, “ela começava a nos ensinar a fazer pas de deux, plié e os negão tudo grandão fazendo plié na barra.”
Foi assim que Paulo começou a trabalhar nesse meio do teatro e da dança, onde ficou conhecido como “Siqueira”. Andava também pela praça Tiradentes e frequentava um bar apelidado de “Ponto”, situado em frente ao Teatro Carlos Gomes que reunia vários artistas, músicos e onde, de vez em quando, ainda se encontrava com o Mestre Roque também.
Gingando pela Europa
A certa altura um produtor alemão, chamado Herr Ulm (Senhor Ulm), de passagem pelo Brasil, depois de vê-lo jogar capoeira, contratou-o para uma tournée na Alemanha. Partiu com um contrato de um ano, para renovação posterior, e ficou baseado na cidade de Hannover. Foi ali que começou a dar suas primeiras aulas para um pequeno grupo de quinze pessoas.
Em seguida trabalhou durante nove meses com um grupo que fazia uma turnê chamada Festival do Brasil. Pouco depois, em 1985, uma alemã, dona de um teatro chamado Zeppelin, em Hamburgo, contratou-o para aulas, oferecendo moradia no próprio teatro. Siqueira estabeleceu-se então em Hamburgo e criou seu próprio grupo, Nzinga, passando também a dar aulas em Hannover e Kiel.
Em 1987 começou a organizar anualmente o Capoeira Sommer-Meeting ─ Encontro de Verão de Capoeira ─ que se tornou um dos maiores eventos de capoeira fora do Brasil. Com início na segunda feira e encerramento no domingo, comportava uma semana inteira de capoeira, palestras e festas, tudo acontecendo no mesmo lugar, em uma grande casa no centro de Hamburgo.
Entre 1987 e 2004, esse evento reunia a cada ano entre 300 e 600 capoeiristas, que vinham da Europa inteira, e sempre contava com a participação de mestres brasileiros estabelecidos na Europa ou vindos do Brasil. Desta maneira, o Sommer-Meeting deu uma grande contribuição tanto para a disseminação da arte, quanto para elevar o nível da capoeira jogada na Europa, além de inovar em termos de organização de eventos.
Aproveite para assistir o vídeo documentárioAlunos de Mestre Roque, uma produção do Capoeirahistory.
Este texto de Matthias Assunção se baseia na entrevita que Paulo Siqueira deu ao Capoeirahistory, em 16 de julho de 2019.