Por Nestor Capoeira.
O discípulo
Eu conheci Leopoldina em 1965, aos 18 anos de idade. Ele tinha 31 e, apesar de estar em grande forma, cheio de energia, o corpo magro e musculoso todo talhado, seu rosto parecia o de um homem muito mais velho ‑ o curioso é que os anos passaram e ele continuou com o mesmo rosto e o mesmo corpo.
Eu cursava a Escola de Engenharia da UFRJ, na Ilha do Fundão. Leopoldina ensinava capoeira na Atlética, a parte desportiva dos diretórios estudantis.
Leopoldina era gentil e amistoso com os alunos. Não permitia que um aluno mais velho batesse num iniciante. Carregava os mais interessados para o samba, para o candomblé e a umbanda, para os morros e para os desfiles de carnaval na Avenida Presidente Vargas.
Era, sem tentar sê-lo, um Mestre completo, que iniciava aqueles universitários, eu entre eles, na cultura “popular” brasileira; na filosofia da malandragem alto-astral – “o bom negócio é bom pra todo mundo” (em oposição à chamada Lei de Gérson, “levo a melhor em todas”, dos 171 e golpistas); e num enfoque da mulher e do sexo radicalmente revolucionários ‑ “ninguém pertence a ninguém” ‑, tanto para a moral burguesa como para os enfoques machistas.
Leopoldina achava que só se deve dar aulas de capoeira duas vezes por semana, e aulas de apenas uma hora; o resto seria correr as rodas e jogar.
Seu método de ensino consistia de um breve aquecimento (uma corrida em volta da sala e alguns polichinelos), algumas sequências de golpes e contragolpes para duplas de alunos (similares às que aprendeu com Artur Emídio, por sua vez baseadas nas sequências de mestre Bimba). Ocasionalmente um treino de golpes, com os alunos se aproximando em fila de uma cadeira e dando, um a um, o golpe por cima da cadeira, e, no final da aula, uma roda de 15 a 20 minutos. Suas aulas geralmente tinham de 4 a 8 alunos. Leopoldina nunca teve “sucesso” no que se refere ao número de alunos; tampouco deu aulas por mais de 5 anos no mesmo local.
Na verdade, quando o conheci em 1965, embora fosse conhecido e querido no meio da capoeiragem, Leopoldina não era renomado, como foi Artur Emídio ou, mais tarde, o Grupo Senzala. Sua fama cresceu lentamente com o tempo, nas viagens que fazia constantemente à São Paulo e na amizade que conquistou no hegemônico Grupo Senzala carioca. Principalmente por sua personalidade alto-astral e positiva, alguém que só fazia amigos e evitava as inimizades, e, mais ainda, por suas músicas de capoeira que, ao mesmo tempo que eram inovadoras na letra e principalmente na harmonia, agradavam até aos jogadores mais chegados à tradição.
Aos poucos, sua figura começou a ser associada, e com razão, aos últimos “bons malandros” e ao próprio Zé Pelintra, uma entidade da Umbanda.
Em 2005, com mais de 70 anos de idade, estava em grande forma física, jogando no seu ritmo rápido com 4 ou mais capoeiras jovens, um jogo seguido ao outro, e era um dos mestres mais conhecidos de nosso tempo, junto aos Mestres João Pequeno e João Grande (antigos alunos de mestre Pastinha, de Salvador).
Seus maiores interesses eram as mulheres, a capoeira, o samba, os carrões (que comprava e equipava com muitos cromados e pinturas), as viagens pelo Brasil e exterior (aonde começou a ir por volta de 1990), as festas, as amizades, enfim, as curtições de quem ama e está de bem com a vida.
Conheci Mestre Leopoldina, no Rio Comprido, RJ, na Av. Paulo de Frontim. Ali ele dava aula para uns 6 a 8 alunos jovens e eu era o bicão da turma com 10 ou 11 anos. Ele me ensinava mesmo de graça para mim. A descrição xe seu carater é perfeita. Marcou a minha infancia e nunca o esqueci. Hoje aos 68 anos, casado a q I ase 50 anos, casal de filhos, 2 netos relembro com prazer aquele curto periodo que convivi com um Malandro que sabia passar bom conselhos para seus alunos. Fica o registro!
Obrigado pelo depoimento, Augusto!